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Abuso Infantil: As Marcas Invisíveis que Carregamos para a Vida Toda

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Abuso Infantil: As Marcas Invisíveis que Carregamos para a Vida Toda

 

Por Eduardo Gonçalves 

O abuso infantil é uma das formas mais cruéis e silenciosas de violência. Muitas vezes escondido por trás de muros familiares, negado por quem deveria proteger ou silenciado por medo, o abuso deixa marcas que não se limitam ao corpo — elas se alojam na mente, nos vínculos e na forma como a vítima vai se relacionar com o mundo ao longo da vida.

Disque 100 (Disque Direitos Humanos) registrou mais de 17 mil violações sexuais contra crianças e adolescentes de janeiro a abril deste ano. Nos quatro primeiros meses de 2023 foram registradas, ao todo, 69,3 mil denúncias e 397 mil violações de direitos humanos de crianças e adolescentes, das quais 9,5 mil denúncias e 17,5 mil violações envolvem violências sexuais físicas – abuso, estupro e exploração sexual – e psíquicas (fonte Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania). No entanto, especialistas alertam que o número real pode ser muito maior, já que a maioria dos casos não chega ao conhecimento das autoridades. O medo, a culpa e o sentimento de impotência ainda são barreiras que impedem a criança de contar o que está acontecendo — especialmente quando o agressor é alguém próximo, como um familiar, vizinho ou responsável direto.

Na perspectiva da psicologia, as consequências do abuso vão além do trauma imediato. Em muitos casos, a criança desenvolve distúrbios emocionais que podem se manifestar na forma de depressão, ansiedade, fobias, dificuldades escolares, distúrbios alimentares e problemas de sono. A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), uma das abordagens mais utilizadas no tratamento de vítimas de abuso, atua justamente na identificação e ressignificação das crenças disfuncionais que surgem a partir da experiência traumática — como sentimentos de culpa, vergonha ou a crença de que “merecia o que aconteceu”.

Outro modelo bastante aplicado é a Terapia do Esquema, que busca compreender os esquemas mal-adaptativos precoces — estruturas emocionais negativas que se formam a partir de experiências adversas na infância. Em casos de abuso, são comuns os esquemas de desconfiança/abuso, abandono e defectividade/vergonha. Essas estruturas podem afetar a vida adulta de forma profunda, dificultando a construção de relacionamentos seguros, a autoestima e a sensação de segurança no mundo.

 Na vida adulta, os sintomas começam a surgir, mas a pessoa nem sempre associa ao que viveu na infância. Por isso, a escuta terapêutica é essencial para reconstruir essa narrativa com segurança e acolhimento.”

O papel dos adultos na proteção das crianças é fundamental. Estar atento a mudanças bruscas de comportamento, quedas no rendimento escolar, isolamento social, agressividade ou medos repentinos pode ser o primeiro passo para identificar que algo está errado. Mais do que observar, é preciso escutar com empatia e criar um ambiente onde a criança se sinta segura para falar.

Outro ponto crucial é a educação emocional. Ensinar desde cedo o respeito ao próprio corpo, os limites do toque e a diferença entre segredos bons e ruins pode ajudar a prevenir situações de abuso e fortalecer a autonomia infantil.

A denúncia é um passo essencial, mas o acompanhamento psicológico da vítima também precisa ser prioridade. A reparação não é simples nem rápida — mas é possível. Com apoio especializado, a criança pode resgatar sua dignidade, reconstruir vínculos seguros e redescobrir seu valor.

Abuso infantil não é apenas um problema da vítima — é um problema social. E enquanto houver silêncio, haverá repetição. Por isso, quebrar o ciclo começa com informação, acolhimento e coragem.

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